Rés de um processo mobilizado pelos Ministério Público Federal – MPF, Instituto Nacional de Tradição e Cultura Afro-brasileira – INTECAB e Centro de Estudos das Relações de Trabalho e da Desigualdade – CEERT, as emissoras já extintas Rede Record e Rede Mulher que hoje respondem pela atual Record TV foram acionadas à Justiça pela exibição do programa ‘Mistérios‘, onde em um dos seus quadros, intitulado ‘Sessão Descarrego’ fazia-se a associação de todos os tipos de males, doenças e desvios de caráter à ação de espíritos e entidades que durante a programação eram (de forma indireta) relacionados aos cultos afro-brasileiros.
Os pastores apresentadores dos quadros muniam-se de simbolismos e termos frequentemente utilizados nas denominações afro-brasileiras para ambientar e responsabilizar essas crenças pelas tragédias que acometiam as pessoas participantes.
Afim de confundir o espectador incauto, utilizavam-se também de imagens de oferendas e supostos testemunhos de conversão de exs pais e mães de santo, que na palavra do apresentador eram exs-bruxas, feiticeiras e ‘mães de encosto’.
Inflando o imaginário popular e colocando a Umbanda, Candomblé e demais manifestações dessas vertentes como ‘bois de piranhas’ para todo o tipo de desgraça social, o programa alimentava o ódio e fornecia justificava para as intolerâncias e violências de cunho religioso.
O processo que iniciou no ano de 2004 (há 13 anos) tem em seu documento de ‘conclusão‘ mais de 20 páginas, enumerando as oposições e contestações das emissoras contra a veiculação do direito de resposta das religiões afro-brasileiras.
Esse tipo de mensagem desrespeitosa, com cunho de preconceito, mesmo que transmitida em horário de pouca audiência, tem impacto poderoso sobre a população, principalmente a de baixa escolaridade, porque é acessada por centenas de milhares de pessoas que podem recebê-la como uma verdade. Por essas razões a procedência da ação é medida de rigor.
M.M Juíza Federal, Dra. Marisa Claúdia Gonçalves Cucio
A sentença divulgada no ano de 2015 – caso entre em vigor – estipula que as rés deverão produzir, cada uma, 4 programas de televisão com duração mínima de 1 hora, sendo que cada um destes programas seriam exibidos em duas oportunidades, totalizando 16 horas de direito de resposta às religiões afro-brasileiras.
As emissoras terão 30 dias para a produção dos conteúdos e 45 dias para a sua exibição.
Quanto ao atraso do cumprimento da sentença, o Juiz Federal Djalma Moreira Gomes, define uma multa de 500 mil reais por dia, para cada emissora, sendo também essas, passíveis de suspensão de toda a programação caso insistam no descumprimento da sentença.
A Record TV entrou com recurso contra a presente sentença e o novo julgamento, regido pelo Tribunal Regional Federal para que se decida por manter a sentença ou não, acontecerá no próximo dia 14 de Dezembro, 2017, na Av. Paulista, n 1.842, Torre Sul, 16. andar, Sala de Sessões da 6º Turma.
Em nome dos autores da ação os advogados Dr. Hédio Silva Jr., Dr. Antonio Basílio Filho e Dr. Jader Freire de Macedo Junior farão sustentação oral em defesa das religiões de matriz africana.
Seja por abordagem textual, verbal direta ou por metáforas ou neologismos é muito comum se usar ‘terreiro de feitiçaria, terreiro de macumbaria, mãe de encosto, pai de encosto’, as abordagens não são diretas, mudou alguma coisa, mas no substancial esse tipo de programa continua diariamente induzindo e incitando os seus telespectadores a atacarem, a odiarem e a discriminarem as religiões afro-brasileiras e seus adeptos. Muito mais importante que essa resposta é o Brasil se dar conta que nós precisamos começar e é um dever do Estado Brasileiro, fomentar uma cultura de paz.
Dr. Hédio Silva Jr. em entrevista à EBC
A Rede Record é uma emissora de TV nacional, fundada em 1953 e posteriormente comprada (1990) pelo Bispo Edir Macedo, este, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus – IURD, segmento neopentecostal responsável pela construção do “Templo de Salomão”, obra arquitetônica localizada no Bairro do Brás em São Paulo, que recebe cerca de 400 mil fiéis por mês.
A IURD já foi alvo de diversas polêmicas, incluindo nesse histórico, o preconceito religioso voltado para as religiões de matriz afro. Um dos casos com maior repercussão é o de Mãe Gilda de Ogum. A Ialorixá faleceu em 21 de janeiro de 2000, vítima de infarto fulminante resultado das frequentes agressões morais sofridas pela IURD.
Folhetim da Universal com calúnia e foto de Mãe Gilda de Ogum
Em reconhecimento a causa e memória de Mãe Gilda, o governo institui em 2007 a data de sua morte, 21 de Janeiro, como o Dia Nacional da Luta Contra a Intolerância Religiosa no país.
Na lista de discursos intolerantes promovidos pela IURD, temos também o livro Orixás, Caboclos e Guias: Deuses ou Demônios? , publicado por Edir Macedo onde ele faz constantes ataques à crença e aos ritos afro-brasileiros, sempre demonizando-os.
O quadro ‘Sessão Descarrego’ utilizava-se de um jogo de palavras e elementos, substituindo os termos originais por outros semelhantes, as quais deixavam claro à quem estava endereçado o ataque.
A tese de mestrado Imagens da Intolerância na Mídia – Apropriação dos Elementos da Cultura Negra pela Igreja Universal do Reino de Deus na Configuração dos Programas Religiosos da TV Record de Carla Maria Osório de Aguiar, reúne 122 páginas de análise sobre os programas Mistérios e ainda também sobre o Casos Reais, exibidos respectivamente, pela TV Record (SP) e sua afiliada na Bahia, TV Itapoan, na grade de programação da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD).
[..] ocorre, na configuração da linguagem desses programas, uma transformação dos elementos constituintes da cultura negra em imagens portadoras de uma mensagem de intolerância religiosa.
Imagens da Intolerância na Mídia, Carla Maria Osório de Aguiar.
O trabalho identifica as estratégias de comunicação utilizadas na recontextualização dos elementos culturais das religiões afro-brasileiras pela IURD, costurando todos os sentidos em que buscou-se trazer por cada palavra, gesto e encenação.
Nesse empenho foram decupados áudios, comparados elementos visuais, cores, discursos.. dentre outros aspectos em uma análise semiótica minuciosa sobre as apresentações promovidas e orquestradas nesses quadros.
É importante destacar que, no programa Mistérios ocorre uma associação dos “encostos” às entidades cultuadas pelas religiões afro-brasileiras. Essa associação fica clara, por exemplo, na deturpação do nome mãe-de-santo para mãe-de-encosto. Durante o trecho da entrevista abaixo, o pastor Luciano chega a se referir à ex-mãe- de-encosto como uma ex-bruxa. É importante destacar que, em nenhum momento, o programa mostra nem o rosto e nem o nome da senhora, que se apresenta como uma ex-sacerdotisa da religião de matriz africana, convertida pela IURD.
Imagens da Intolerância na Mídia, Carla Maria Osório de Aguiar.
IMAGENS DA INTOLERÂNCIA NA MÍDIA – Apropriação dos Elementos da Cultura Negra pela Igreja Universal do Reino de Deus na Configuração dos Programas Religiosos da TV Record.
Em conversa por telefone com Carla Osório, ela revelou de primeira mão ao Blog Umbanda EAD que em 2018 a sua tese irá se transformar em livro, lançado no mesmo ano e que pra ela seu trabalho não faz nada mais do que traduzir tudo o que se pretendia dizer com o discurso propagado pelos programas.
O processo pelo qual Dr. Hédio Silva Jr. junto do Dr. Jader Freire de Macedo Jr. e do Dr. Antônio Basílio Filho representam, é um marco na história da Justiça e da Televisão brasileira, das religiões de matriz afro e da cultura negra.
O direito de resposta à essas religiões demarca uma honrosa conquista de respeito e espaço social, onde o Estado Brasileiro ainda se mantêm omisso.
Por isso é de extrema importância a presença de todos que de alguma forma se veem tocados pela causa, seja adepto, seja dirigente, seja defensor da causa ou que somente acredite num país laico e em uma cultura de paz e respeito.
O que?
Julgamento contra recurso da Tv Record na sentença que estipula o direito de resposta ao programa Mistérios (quadro ‘Sessão do Descarrego’) da Rede Record e Rede Mulher, pelas religiões de matriz africana.
Quando?
A Rede Record entrou com pedido de adiamento do julgamento, a data agora está prevista para o mês de Fevereiro de 2018. Leitor, fique atento as nossas publicações.
Que horas?
14 horas
Onde?
Prédio do Tribunal Regional Federal
Av. Paulista, n 1.842, Torre Sul, 16. andar, Sala de Sessões da 6º Turma
Texto:
Júlia Pereira
Imagem:
Reprodução Youtube
Fontes:
Tese de Mestrado Carla Osório, IMAGENS DA INTOLERÂNCIA NA MÍDIA – Apropriação dos Elementos da Cultura Negra pela Igreja Universal do Reino de Deus na Configuração dos Programas Religiosos da TV Record
Assessoria Dr. Hédio Silva Jr.
Processo nº 2004.61.00.034549-6
1 Comment
Devem vee que nao tem direito de julgarem porque todos nos cultuamos nossa religiao nossos deuses e isso nn e motivo de apedrejarem de espancar e matar nossa religiao temos que nos unir sermos irmaos tanto um quanto outro tem que se ver que nn cultuamos o diabo porque pra nos camdomblecista diabo nn existe cultuamos nosso antepassados orixas que foram nos mesmo mais no antepassado nossa casa doa amor fe caridade respeito pelos irmaos tanto do axe quanto de igrejas nos camdomblecista somos de paz uniao matamos a fome de quem tem fome entao vamos see irmaos vamos mostrar que temos coracao onde ha um deus um orixa nn tem odio nn tem preconceito vamos nos unir pra um pais melhor sem diferenca sem raca sem preconceito de cor de raca o povo precisa nos aceitar assim como nos os respeitamos isso precisa no mundo respeito uniao