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Do Catimbó aos Terreiros. Como Zé Pelintra chega na Umbanda?

Em cada região do país ele vem com uma roupagem, em cada lugar que passa desfila um figurino, para cada caminho que percorre faz isso de forma singular e assim, se manifesta nos mais diversos credos, tradições e crenças brasileiras. Fala a cada uma delas se adequando ao espaço que lhe foi concedido.

Por isso também multiplica-se em suas formas de ser e sentir e desta forma ganha expressão, SeoZé agora é conhecido, “tem nome” e às vezes até é chamado de ‘doutô’.

Dentro do gingado – próprio da malandragem – se comunica e se faz entender e cooomo é bom em se fazer entender.. é bom porque se identifica e se identifica porque fala de igual, fala com a propriedade de quem já passou pelos mesmos desacertos. É essa essência que carrega consigo, de quem já esteve às margens, de quem viu de frente o olhar que fulmina injusto e recaí inevitavelmente sobre o menos favorecido.

Adaptável, como bom malandro tem que ser. Brinca com o contraditório, ora é sagrado, ora é profano. Confunde os menos avisados e surpreende os acomodados.

Mas quem é esse espírito, que transita por entre as religiões, que não se restringe a uma só linha de manifestação e que abriu as portas dos terreiros para que a malandragem invadisse as giras, transformando o espaço do sagrado na rua, nos becos e nas vielas?!

Prazer, José Pelintra. Para os mais chegados SeoZé. Hoje leitores, vamos entender um pouco mais sobre essa manifestação.

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Catimbó e Macumba Carioca

Antes de surgir na Umbanda, inclusive antes mesmo da Umbanda nascer, a personificação de Zé Pelintra já se apresentava no Catimbó (norte do país) e nas Macumbas Cariocas.

No Catimbó ele era entendido por meio dos mitos e lendas sobre sua suposta vida (suposta porque não há provas evidentes de que ele realmente tenha existido nesse plano) e nessa manifestação traz consigo um traje mais simples do que o visto na imagem popular em que ele usa terno e sapatos brancos e na cabeça carrega um chapéu panamá.

No Catimbó ou na Jurema Sagrada, Zé usa chapéu de palha e cachimbo de angico, é um homem forte, robusto e joga capoeira como ninguém.

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Zé Pelintra Catimbozeiro. Ilustração Pedro Belluomini

Nesse culto ele se encanta* e se apresenta pela primeira vez como Mestre Zé Pelintra ou Príncipe Zé Pelintra. Pai David Dias explica sobre sua manifestação dentro desse sistema de crença dizendo que já nesses primórdios ele trazia “aquele jeito extrovertido que interage com as pessoas, começa a contar histórias de suas vivências e aquilo cativa, porque após seu encantamento ele traz  histórias de como driblou os desafios da vida”.

Destacamos aqui que no Catimbó Zé Pelintra é um espírito, porque nesse culto o espírito não se aproxima do médium e incorpora como acontece na Umbanda, mas sim irradia suas energias de onde ele está. Desta forma Zé Pelintra não é entendido como uma falange e sim, como um espírito que já viveu em terra e que “acosta” nos catimbozeiros.

Obs: hoje boa parte dos “novos juremeiros” acreditam que esse mestre se tornou uma consciência e que não acosta mais em seus filhos.

Existe um ser irradiando a sua força, sua energia em todos os seus filhos ao mesmo tempo. Por isso há uma similaridade, entre as manifestações de Zé Pelintra no Catimbó.

David Dias, em Zé Pelintra e Os Malandros

Bem, mais tarde por consequência do êxodo rural, que acontece por sua vez, em decorrência da seca nos sertões nordestinos, Zé Pelintra migra para os centros urbanos e aterriza no morro carioca, tendo assim seu primeiro encontro com as efervescentes macumbas cariocas.

O tutor explica sobre as macumbas ressaltando que naquele momento acontece um culto que mesmo que se configurasse como uma busca pela caridade, eclodia de forma desorganizada e portanto incorporava-se nos médiuns vários espíritos.

Nesse momento no morro carioca começam a acontecer muitas manifestações bem próximas ao que era Zé Pelintra e aí nascem outros malandros dentro do que era entendido como a malandragem naquela época. Não era só Zé Pelintra que agora estava, agora tinha Zé Pretinho, Camisa Listrada, Malandras, Maria Navalha, tinham vários outros malandros, vários outros que se apresentavam na mesma característica de Zé Pelintra.

David Dias Delgado, no curso Zé Pelintra e os Malandros

Enfim Zé Pelintra agora está na “cidade grande”, se aconchega no morro e de lá só “desce” para iniciar sua trajetória na Umbanda.

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Zé Pelintra Malandro – arquétipo manifestado na Macumba e na Umbanda
 Linha dos Malandros e Zé Pelintra 

Agora que Zé chega na Umbanda ele precisa de uma linha para manifestar correto? Bom, quando falamos de Zé Pelintra as regras realmente não fazem tanto sentido assim.

É comum que presenciemos a manifestação de Zé Pelintra e dos malandros em diversas linhas de trabalho, sendo as mais comuns a de Baianos e Exus.

Pai Rodrigo Queiroz fala sobre isso no estudo Entidades de Umbanda ressaltando que a “mística dos malandros é uma miscelânea cultural religiosa” e por esse motivo eles também vão agregar características de manifestações diversas. “Pode vir Malandro com muita influência do Catimbó que usa do cachimbo da Jurema, pode vir aquele malandro “mais carioca” que se parece com Exu que usa charuto, cigarrilha.. tem o malandro de Pernambuco que fala muito de Encantados e isso vai se moldando de acordo com as influências do terreiro e também daquele espírito – qual região ele quer trazer naquele momento para influenciar” explica o sacerdote.

Dessa forma, podemos entender que a falange ‘Zé Pelintra’ transita por entre várias linhas em razão dessas agregações culturais ao qual essa personificação passou e que por ora se propõe trazer para a casa.

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Então encontramos grupos de espíritos que trazem o mistério malandro (força e atuação espiritual; falaremos mais disso em outro texto) e o campo de atuação dessa linha, mas que vibram em si também outras características usando, por exemplo, elementos, trajes, modos de falar e se comportar, ensinamentos e etc vistos em outras manifestações religiosas e populares, que o possibilitam trabalhar em diferentes linhas e receber delas suas irradiações.

Linha dos Malandros” é uma nomenclatura que surge recentemente sendo a mais nova dentro da religião e por esse motivo – atualmente -passa por um processo de adequação e entendimento pelos umbandistas, mas que já existe dentro da Umbanda no plano espiritual e é regida e sustentada pelos divinos orixás.

Como dito Zé Pelintra pode se manifestar em outras linhas, mas quando acontece uma gira propriamente de malandro ‘Seu Zé’ chega e junto da sua falange, falanges de outros malandros também se unem nessa manifestação.

Pai Rodrigo disserta em transmissão ao vivo via facebook dizendo “Zé Pelintra é mais para ser contemplado, sentido e vivenciado do que explicado com uma fórmula que finalize essa discussão.”

Pois bem o que podemos entender então é que Zé Pelintra é uma falange que transita com maior liberdade pelas linhas de trabalho e que se apresenta dessa forma porque se adequa (e isso também faz parte do seu mistério) a maneira que as casas e seus adeptos a assimilam.

Não quer dizer que Zé Pelintra seja o chefe da linha de malandros, mas ele é a personificação do malandro e a falange desse mistério que mais se popularizou dentro da Umbanda e também na cultura popular.

*encantar no catimbó = nessa vertente acredita-se que após a morte algumas pessoas se “encantam” e viram mestres que se manifestam no culto, trazendo ensinamentos e promovendo curas.

 

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Texto:

Júlia Pereira

Imagem:

Pedro Belluomini

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Júlia Pereira

Acredito no poder da sabedoria ancestral da contação de histórias, como forma de cura, acolhimento e força. • Jornalista • Estrategista e Copywriter • Pós-graduada em Marketing, Branding e Growth • Estudante da EAD Ubuntu.

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