Rainha das ondas, sereia do Mar..
Exibindo um longo cabelo preto, pairando sobre as águas salgadas do mar e trajando o mais belo azul celeste Mãe Iemanjá abre os braços, deixando cair de suas mãos pequenas pérolas que trouxe consigo do fundo do mar.
Assim é a concepção que a Umbanda tem da Rainha do Mar, dizemos isso, porque é dentro da crença umbandista que surge esse retrato. Essa é única imagem de Orixá genuinamente umbandista e a qual devemos boa parte da popularização de Iemanjá.
Essa imagem se popularizou tanto, a ponto de encontrarmos pessoas que sabem que essa ela se refere a uma Orixá a qual chamamos de Iemanjá, no entanto, não fazem a mínima ideia do que seja a Umbanda. E isso também é coisa de Mãe Iemanjá né? Detentora do mistério criador e gerador, reúne em torno do seu culto até mesmo aqueles que não compartilham da crença no panteão de Orixás.
Por isso, tem quem deposite sua fé, voltando-se para imagem da Orixá sem saber da sua história ou origem mas não deixa de sentir seu amparo e o aconchego da Divina Mãe.
Origem
Várias são as versões sobre o surgimento do quadro de Iemanjá que originou as imagens que vemos hoje nos templos de Umbanda. A primeira delas, descrita no livro História da Umbanda no Brasil, Vol III, de Diamantino Fernandes Trindade, é a versão do escritor José Beniste, historiador e pesquisador das religiões de matriz africana, onde diz-se que ela foi criada na déc de 50 quando o marido da Dra. Dala Paes Leme, como forma de homenagea-la, mandou pintar um quadro com suas feições.
Na pintura (imagem abaixo) que possui semelhança com as imagens populares da Orixá, a mulher pintada possui traços indígenas (parece uma cabocla), tem estatura média a alta e é morena. Ao quadro foi atribuído o início das festividades de Iemanjá no fim do ano nas praias do Rio de Janeiro.
Diamantino destaca no livro também uma outra versão, na qual a senhora Dalas teria tido uma visão dessa figura e pediu para que um artista (desconhecido) à pintasse.
Ela mesmo era parte integrante da “Comissão de Divulgação da Imagem“. Sim, existia uma comissão que tinha como objetivo divulgar a pintura e que organizava procissões com o quadro por entre os terreiros da época e que a mesma senhora Dalas a presidia.
A partir dessas iniciativas e em razão do esforço de diversas entidades em divulgar a imagem de Iemanjá que várias outras representações (semelhantes a esta) foram reproduzidas dentro dos terreiros e em diversas manifestações populares, até se chegar a amplitude e a forma que vemos hoje.
No livro de Diamantino também encontra-se um trecho da matéria do Jornal de Umbanda, n. 78, de abril de 1958 que registrou a presença do quadro nos terreiros de Niterói:
No dia 21 de fevereiro a Tenda Tujupiara fez levar em bela procissão à noite, sob as luzes de milhares de velas, com enorme acompanhamento o referido quadro (de Iemanjá) para o Centro São Sebastião, sito à Travessa Filgueiras, no bairro do Fonseca e que obedece à direção material do irmão Custódio seu presidente e que tem como Babá a irmã Maria de Oliveira. Ofereceram os componentes deste conceituado terreiro uma magnífica manifestação à chegada do quadro e a todos que acompanhavam a procissão.
Enfim, se ela foi uma inspiração de Dala ou se foi feita em sua homenagem não há conclusões sobre, mas é certo que – segundo o próprio Diamantino – esta imagem “ocupou o imaginário dos umbandistas da época” e com isso, fez surgir um retrato próprio dessa crença para a Orixá Mãe do panteão africano.
A Dra Dala, filha de Iemanjá e umbandista assídua, chegou a compor uma poesia sobre a suposta visão que teve da Orixá, confira um trecho:
Uma estranha mulher! Calma, serena,
Que serenamente parou:
– Olhos verdes, cabelos acastanhados,
Não era branca, nem cabocla, nem morena;
Tinha o semblante para, lívido, mestiço,
Com muito de quebrante e muito de feitiço
Não sorria. Não falou.
Como dito pela própria Dra. Dala, no primeiro quadro sua pele não era tão clara como vemos nas gravuras atuais, ainda assim, a aparência entre elas traz muita semelhança.
A pesquisa realizada por Diamantino em sua obra, leva em consideração periódicos da época e fatos ocorridos nessa fase da religião. Para quem deseja se aprofundar e saber mais sobre essa história bem como a popularização da festa de Iemanjá indicamos o acesso ao livro citado e aos estudos oferecidos pela plataforma Umbanda EAD.
Texto:
Júlia Pereira
Imagem:
Arquivo ICA
Links úteis:
A história da Umbanda no Brasil, vol III